Enquanto minha mãe lutava contra a COVID-19 na UTI do hospital São Luiz, minhas orações partiam de um coração preocupado e com medo. A COVID-19 é uma doença cheia de crueldades, mas a falta de ar que causa ao infectado e o distanciamento dos familiares são os seus piores efeitos.

As chamadas de vídeo que o meu pai fazia com ela, amenizavam a angústia de quem, pela primeira vez na vida, imaginou-se sem o maior amor da sua vida. Mesmo assim, enquanto ela esteve internada, todos os dias de manhã o estado de angústia se renovava dentro do meu coração.

Embora suspeitasse da gravidade da situação, demorei para ter noção da luta travada pela vida. Minha mãe conta que os primeiros três dias foram terríveis. Em suas palavras, a morte esteve na sua frente. Evitei fazer alardes, insisti na oração e no silêncio – é um tempo de muito sofrimento, não quis alarmar amigos e familiares sem a certeza da gravidade. As ligações diárias dos médicos serviam para amenizar o desespero.

Quando me perguntam se oro, a resposta é sempre esta: de que tipo de oração você está falando? Isso porque depois de muitos anos como evangélico, ressignifiquei minha espiritualidade e o meu ser religioso. Abandonei a ideia de que existe um Deus que manipula ou coordena todas as coisas no mundo, para me encontrar com uma espiritualidade que enxerga em Deus um pai imerso no sofrimento humano, abraçando e sendo abraçado, intervindo no mundo em amor através dos humanos.

Minha mãe melhorou, mas o número de mortes não parou de subir. Do quinto dia de internação em diante a sua situação se estabilizou, mas a angústia insistiu no meu coração enquanto ela esteve internada – teve alta, mas foram quinze dias internada. Diariamente, o número de mortes subia, minha oração não podia tratar de outra aflição, entre tantas lutas travadas no ambiente da existência, senão a do filho com medo e do humano aterrorizado assistindo a perda diária de vidas, um tanto pela força assassina do vírus, outro tanto pelo descaso de algumas autoridades.

No momento em que escrevo este texto, mais de 100 mil vidas foram tragadas pelo vírus no Brasil e mais de 700 mil no mundo. Sigo orando uma oração que pede ao bom Deus para que continue fortalecendo os familiares e amigos enlutados, os profissionais da linha de frente e os doentes. Sem mágica nem magia, ao pai de Jesus só me resta pedir que não nos deixe perder de vista todo o seu amor, graça e misericórdia.

É certo que este tempo difícil vai passar, mas nada mudará em nós para melhor se não nos reinventarmos em solidariedade e amor. Creio que a oração pode nos ajudar. Oremos.

Presbítero William Carvalho

Um comentário em “Neste tempo difícil, oremos”

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